A fotografia é um recurso de informação e de comunicação. Ela informa fatos, acontecimentos da vida, mas, ao mesmo tempo, ela é um instrumento de comunicação de afetos, já que através delas partilhamos histórias de vida.
Um dos meus livros favoritos é "A câmara clara", de Roland Barthes, de 1980. A fotografia, na sua visão, pode ser louca ou sensata, mas cabe a nós escolher por qual via a apreciaremos. Pela via da sensatez, apenas consumindo imagens, fotografias como artefatos generalizáveis, banais, sem nenhuma loucura. Pela via da loucura, se afronta na fotografia "o despertar da realidade intratável" (p.175).
No passado, a ação do\a fotógrafo\a era um mistério fascinante. Basta olhar fotos antigas e ver a cara de interrogação-espanto que as pessoas faziam ao olhar para a câmera. Ao mesmo tempo, a foto nos interroga. Esta foto me faz pensar. No fundo, diz Barthes, "a Fotografia é subversiva, não quando aterroriza, perturba ou mesmo estigmatiza, mas quando é pensativa" (p.62).
Foto da Família Roso - Sentados, Nonno Ricieri Roso, Nonna Thereza Fazzolin Roso. Ao fundo, Alberto, Delfina, Maria, Guerino e Pedro.
Fotógrafo\a: Desconhecido
Ano aproximado: 1949
Local: Vila Maria (Passo Fundo), Linha 18, RS, Brasil
De fato, se no passado tirávamos fotos apenas em momentos marcantes, como em casamentos, aniversários etc., hoje, cada vez mais, o ato de fotografar é uma prática cotidiana, banal. Mas disto não devemos subtrair o que a modernidade trouxe de positivo. Muitas crianças não somente apreciam estar em fotos como elas costumam adorar tirar fotos. Ao fotografarem, a criança passa ser também uma autora ativa das narrativas de vida.
Os adultos também, com o avanço da tecnologia, dos smartphones especialmente, com recursos fotográficos surpreendentes, também começaram a ser mais ativos no processo, saindo da cena fotografada para entrar na encenação de fotógrafo. E isso não acontecia no passado. (Será que a profissão fotógrafa/o está fadada a morrer?).
Barthes vai dizer que frente à câmera, quatro imaginários se cruzam, se afrontam, se deformam. Naquele momento, "sou ao mesmo tempo: aquele que eu me julgo, aquele que eu gostaria que me julgassem, aquele que o fotógrafo me julga e aquele de que ele se serve para exibir sua arte" (p.27). Bom, aquele\a fotógrafo\a que exibiu sua arte ao tirar uma foto da Famíglia Fazzolin Roso, não se preocupou com os detalhes do cenário, já que o fundo de tecido, que deveria estar centralizado, não está. Talvez justamente ai mora a arte, na captura daquilo que é realidade para os sujeitos fotografados.
Certamente, as fotos expressam seu tempo, seu lugar. Se nesta foto com meus nonnos, espontaneidade era artigo de luxo, com as mudanças na forma de educar os filhos, as fotos começam a verter espontaneidade, especialmente das crianças. A foto que segue é de uma festinha de meu aniversário, 6 ou 7 anos, acredito eu, não tenho certeza.
Foto de Aniversário - Ao fundo, à direita, eu (Adriane Roso) e ao meu lado Maristela (não lembro sobrenome, filha da Lourdes, amiga de minha mãe). Em pé, de camiseta azul, Donato (também não lembro sobrenome). Os demais da foto, não sei quem são.
Fotógrafa - Alexandrina Rubio Roso, minha mãe
Ano aproximado: 1972 ou 1973
Local: São Leopolodo, RS, Brasil
Uma foto permite lembranças florescerem; olhar fotos é como fazer uma viagem no tempo e ter a certeza de que se pertence a uma família: “Como é bom ter uma mãe, um pai, alguém que me cuida!... Ah, eu era assim... nós fazíamos isso juntos...”. Uma fotografia revela as presenças mas também as ausências, mexendo com os sentimentos, com aspectos do nosso inconsciente.
Nesse jogo-brinquedo de tirar fotos, o vínculo entre pais e filhos pode se fortalecer. Mães, pais, cuidadores e filhos brincam juntos de criar, de representar momentos.
Do mesmo modo, olhar álbuns de fotos junto com a família pode ter um efeito lúdico-terapêutico. Lúdico por que nos remete a uma atividade prazerosa infantil e terapêutica por que propicia o diálogo. As mães, os pais, as/os cuidadoras/es, ao estimularem seus filhos a pensarem e perguntarem sobre as fotos de família, estão também estimulando a imaginação das crianças. Sendo a imaginação uma necessidade básica humana, podemos dizer que o diálogo sobre família atua diretamente sobre o fortalecimento da saúde mental.
Por isso, aqui deixo uma sugestão: tirem muitas fotos com suas/seus filhas/filhos, mas não como se tivessem no botão automático. Apreciem as fotos antigas com a família unida, estimulem elas/eles a fazerem perguntas sobre as fotos. Tenho certeza de que elas/es jamais esquecerão esses momentos de informação e partilha e, ainda por cima, poderão aprender um pouco de história. Sobre isso, aproveito para indicar um artigo de minha autoria Construção de árvores genealógicas
Obs: esse texto teve uma versão anterior publicada não lembro mais onde. Aqui ele foi reformulado, ampliado.
Referência
Barthes, Roland (1980\1984). A câmera clara (6.ed.). Nova Fronteira.
Roso, Adriane (2010, jul.set.). Psicologia E história: Acerca Da construção De árvores genealógicas Ou Como Retomar lembranças De família Em Sociedades De Rede”. Psico, 41 (3), 385-392.385-392
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