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Poesia Feminista - Coração Amarrado

 


Coração Amarrado*

Autoria: Ana Carolina M. Tambara
Ana Paula Wiethan
Andressa Sevéro Bayer
Débora Solano




Parecia simples demais
Nascer, viver e morrer
Então, no trajeto impuseram-nos limites
Podaram nossas asas
Prenderam nosso voo
Acúmulo dos “não pode” e dos “não faça”
Não pode se comportar assim
Não pode ser assim
Não pode falar isso
Não pode usar aquilo
Não pode...
De tantos “não pode”, pensei que nada podia
E que de nada poder
Nada eu seria
 
Colocaram-me em uma caixa
Fizeram-me quadrada
Maquinaria de concepção
Máquina de pilotar fogão
Inacessível a todo respeito
Mas acessível a todas as mãos
Portas da minha casa
Iguais a outras milhões
Revelam o mistério da rua
O medo real
Os olhares atentos
Os assobios arrepiantes, sujos, humilhantes
Como se não tivesse mais nada
Como se não fosse nada
Com os estereótipos a conduzir a vida
Com os nervos a tremer por toda ida
 
Tudo é real
Tudo é perplexamente real
Mexeram com a vizinha
Mutilaram a amiga
Abusaram a filha
Mataram a mãe
Continuo a crer que nada serei
A que não nasceu para ter o quer
Coração amarrado de dores
Peso carregado nas costas e nos pés
 
Ousaram lutar
De tudo que queriam
Tudo ainda parecia pouco para tudo o que ainda se quer
E tudo que ainda se quer é pouco para o que se precisa
E o que se precisa ainda é pouco, mas é muito para uma mulher
 
 
Carrega todos os sentimentos do mundo
Mas carrega mais falta do que um homem qualquer
A vida é pouco, mas é muito
Desassossego de manchar o psíquico
Angústia de sufocar o peito
E de não receber igualdade ou dignidade sequer
 
Acendem as luzes do dia
Apagam-se à noite
Seja de que maneira for tudo permanece onde está
Da luta renhida, gritada, aberta, rendida é preciso continuar
Calam nossa boca
Silenciam nossos gritos
Põe-se no caminho
Enfrentam nossas vozes e interrompem o nosso choro aflito
Sendo de todas as maneiras
Lutando por todos os lados
Desejo de ser mais do que um objeto
De ser vítima de nada além de afago
 
Perdemos batalhas
Mas a guerra ainda não foi vencida
Seguimos na luta, buscando união
Vozes em coro, implorando por compreensão
Nossos passos tornam-se quilômetros na ida
E a esperança segue no horizonte, ó mulher destemida
 
Por todas que vieram antes de nós
Pelas que aqui estão e pelas que virão
Honraremos para que seus esforços não tenham sido em vão
A que vejo no espelho e a que cruzo na rua
De tantas vozes que revelam a verdade nua 
Daquelas que sonham outras realidades
Daquelas que se impõem pelas suas vontades
Dentro das desilusões, dessa subsistência irada
De ser muito mais do que tudo 
Mas ser tratada muito menos do que nada

Cidadã, liberta e dona de meu corpo 
A calar o universo, a desarticular o que me desrespeita e mais um pouco
A lutar pelo feminismo como forma de ter um lugar na vida
De ser segura, forte e enaltecida
De ser tudo que um dia eu pensei que podia
De falar, poder, saber e ter autonomia
E assim, de tão simples que a vida me parecia
O único desejo é de com luta ter um lugar que um dia me respeitaria.

* Poesia criada para a disciplina de Psicologia Social II -  A (PSI167), como parte das atividades propostas no semestre.

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